Date: Sun, 23 Jan 2005 15:21:57 -0300 (ART) From: Gil Fonseca To: nobre@lince.cii.fc.ul.pt Subject: Do ensino da fraude ao policiamento dos professores Após ter lido um artigo sobre o livro acerca dos «rankings» das escolas publicado pelo ex-ministro da educação, altamente tendencioso numa análise pouco honesta dos números, eis o meu espanto e estupefacção ao surgir um novo artigo de Isabel Leiria, sugerindo a necessidade do policiamento dos professores nas suas aulas. A conclusão a que se pretende que as pessoas cheguem é o argumento da moda: a falta de qualidade do ensino está nos professores. Só quem está por fora do ensino é que não conhece a verdadeira razão da falta de qualidade do ensino da matemática e de outras disciplinas no ensino básico e secundário: a pressão política dos números. Em vez de no ensino básico, por exemplo, serem aprovados os alunos que se esforçaram e que o merecem, a pressão sobre os professores leva a que se passem quase todos: alunos com 4 ou 5 classificações negativas tranquilamente atingem o 9º-ano, à custa da complacência hipócrita dos conselhos de turma, fomentada politicamente, e de um filosofia facilitista descarada, que há muito se instalou como dominante na educação no nosso país. À medida que os alunos transitam de ano, vai-se tornando um absurdo cada vez maior ensinar: Alunos no 11º-ano, por exemplo, não têm em muitos casos os conhecimentos do 8º, 9º, ou 10º- porque passaram graças a este sistema. Ora, a culpa disto não é da má formação pedagógica dos professores ! Deste facto ninguém fala, sendo mais conveniente colocar a responsabilidade na alegada má preparação dos professores e sugerindo soluções centradas nestes, quando o problema está na maneira como (não) se avalia. Esta avaliação fraudulenta, fruto da pressão das estatísticas, pode produzir muitos milhares de alunos com o diploma do 9º ano ou 12º ano, mas nunca produzirá alunos bem preparados. Por outro lado, o ensino não passará a ter mais qualidade com um sistema de policiamento indigno dos professores, enquanto uma avaliação exigente não se tornar um critério dominante, em vez desta obsessão por uma massificação de ensino medíocre onde tudo vale para passar alunos. A ideia de que acabar com o chumbo (como na Finlândia) poderia melhorar a qualidade do ensino, tem tanto de absurda como de desonesta. Se a questão for o nível de desenvolvimento real que os alunos finlandeses atingem (e não simplesmente as médias) há de certeza mais factores envolvidos para além de não serem permitidos os chumbos^Å.Parce incrível que a solução de não poder chumbar seja a apontada para melhorar a qualidade do ensino, quando pelo contrário, só uma avaliação exigente pode permitir a mudança deste estado de coisas. Para os políticos esta avaliação falseada de que o ensino português vive é conveniente, porque aumenta as estatísticas de aprovações (sacrificando a qualidade), para os pais torna-se conveniente a curto prazo, pois estes estão interessados essencialmente com os diplomas dos filhos que lhes darão «habilitações» para o mercado de trabalho; para a maioria dos alunos - o que é fácil é que está bem - e para muitos professores também, é mais fácil alinhar neste jogo de fabricar notas do que levantar ondas. Desculpem-me lá levantar esta onda... «There is not such a thing as priceless learning»