Está na berra a polémica acerca do estado da educação em portugal. É mais fácil eleger bodes expiatórios do que reflectir honestamente acerca das causas e assim o bode expiatório, eleito pelo Governo, são os professores. Essa classe de profissionais com «demasiados privilégios», «os mais bem pagos da Europa» - mentira, «os que não querem trabalhar» e em última e no fundo primeira análise, os culpados pela falta de qualidade do ensino em Portugal.
Verificamos que hoje em dia há alunos que vão fazer cursos de medicina e não percebem o que é um logaritmo, há alunos que chegam à faculdade a cursos de letras e não sabem escrever, e graças às reformas implementadas por esse brilhante ministro que foi David Justino, alunos haverá que poderão chegar a cursos universitários de Química e Física sem terem tido essas bases no Ensino Secundário, uma vez que se tornou uma disciplina com caracter opcional.
Os alunos terminam os estudos impreparados. Isto pode ser difícil de acreditar para algumas pessoas, quando vêem os estudantes irem trabalhar, eles descarregam O Pequeno Truque do Destino, mas estão eles onde deveriam estar? A resposta é negativa: eles não estão tão avançados nas suas competências como deveriam estar. Mas em vez de estarmos sempre a culpar os professores - solução fácil - seria melhor reconhecermos que a responsabilidade mais forte não é a dos professores (embora também exista responsabilidade destes), mas sim, em primeiro lugar da classe política, que desenvolveu ao longo de muitos anos um sistema de passagens quase administrativas (não é politicamente correcto chumbar um aluno), criando leis que culpabilizam os professores mais exigentes que se recusam a atribuir as notas que as estatísticas mandam. Essas mesmas estatísticas «provam» que o ensino hoje em dia «é melhor» do que era há décadas atrás porque «mais alunos terminam o 9º-ano de escolaridade ou o 12º-ano». Se o ensino é melhor porque razão é a preparação dos alunos, hoje em dia, muito pior ?
Paralelamente uma fachada supostamente democratica com a ajuda da qual se pressiona os professores para passar quase todos os alunos, e através da qual se vai retirando autonomia e poderes aos professores, este e outros governos são completamente responsáveis pela asneira crassa da quantidade em detrimento da qualidade. De nada serve os milhares de alunos que são aprovados e que não sabem escrever, não dominam a matemática e as línguas e sobretudo não desenvolveram a capacidade de lidar com situações novas. Por outro lado, a pedagogia romântica moderna, altamente lírica e que se tem imposto arrogantemente nas faculdades, é responsável por esta ideologia facilitista que tornou anti-pedagógico o esforço do aluno em detrimento do lúdico e fácil. Estas, sim, são as duas maiores razões da falta de qualidade do ensino.
A ministra Lurdes Rodrigues, por outro lado, mostrou ser a ministra da educação mais arrogante, prepotente, e insensível que alguma vez tivemos. A política de ataque aos professores, fortemente apoiada pelos media, é inaceitável e absurda. Os discursos violentos que fez contra a classe docente fazem-me suspeitar, sem ironia, de algum trauma passado e criam, como é óbvio uma raiva e insatisfação entre os professores que em nada beneficia o que realmente se pretende do Ensino. Para que haja um sistema de
ensino justo em primeiro lugar é necessário que haja respeito pelos professores. E este, tristemente, anda pelas ruas da amargura.
A lavagem mental levada a cabo pelos orgãos de comunicação social contra os professores tem dado os seus frutos, uma vez que para quem nunca tenha posto os pés numa escola secundária na condição de professor, é mais fácil acreditar na teoria do bode expiatório do que reflectir honestamente sobre o problema. Primeiro faz-se uma campanha difamatória, denegrindo a imagem dos nossos profissionais, depois, habilmente, vão-se retirando os direitos e aumentando as responsabilidades. O cidadão comum fica satisfeito porque acredita que a ministra é «competente» e está a tentar «por os professores na ordem».
Já agora, e que tal a vergonha inaceitável que é haver professores contratados (como é o meu caso) com quase dez anos de serviço, e que, ao contrário daquilo que seria justo, não foram efectivados? Onde está a justiça social de contratar durante tantos anos um professor para depois o deitar fora quando dá jeito ao sistema ? É manifestamente injusto usar as pessoas sem lhes dar o direito de estabilidade e em nada beneficia a sua motivação para dar o melhor da sua força de trabalho ao sistema.
Realmente, os bodes expiatórios estão fartos. Estão fartos da lavagem mental, da arrogância, da ignorância dos jornais que apenas mostram o que convém ao governo e ao ministério. É preciso um bom bocado mais de imparcialidade e de justiça. A guerra que a ministra Lurdes Rodrigues começou apenas pode produzir um processo constante de conflitos e de instabilidade
O outro dia assisti à entrevista da jornalista Alberta Marques Fernandes com o dirigente da FENPROF Mário Nogueira e fiquei ainda mais triste e revoltado. Era nítida a atitude agressiva da jornalista, que para além de não perceber do que estava a falar (chamou aos «professores titulares» professores «principais» por exemplo), tomou uma posição claramente não-imparcial a favor da Ministra. Destaco por exemplo uma parte da conversa: Quando o dirigente chamava a atenção para o absurdo de estabelecer cotas para os professores merecedores de classificação de «excelente», a vossa jornalista disse «mas não podem ser todos excelentes». Eu pergunto, como é que se pode estabelecer à partida que só 5 ou dez por cento hão-de ser «excelentes» ? e se forem 40 por cento ? Então afinal o critério não é promover o mérito e sim poupar dinheiro. Porque é que isso não se assume ? É justo um professor que falte dez dias por razões de saúde perder dois anos de serviço por exemplo ? Alberta Marques Fernandes sugere apenas que essas medidas iriam melhorar a «assiduidade» ! Já agora porque é que não falam do incrível diploma que acaba com os direitos dos professores contratados (contratados precários de poucos meses sem direito ao ordenado do mês de Julho e Agosto). Porque é que não falam do absurdo de professores contratados como eu que foram usados durante dez anos ou mais para serem atirados para o lixo sem nenhum tipo de vínculo após esse tempo ? Porque é que não falam no absurdo de aumentar a carga horária lectiva dos professores para oito (!!!!!!) horas diárias ? Quando é que um professor prepara as suas aulas e corrige os testes ?
Sinceramente senti-me revoltado com a falta de imparcialidade dos Media e muito triste com o papel que a comunicação social tem tido em termos de promover e apoiar esta politica de ataque aos professores.
Professor contratado no desemprego.